fonte
da imagem : http://www.skoob.com.br/livro/15678-claro_enigma
CARLOS
DRUMMOND DE ANDRADE
A
Máquina do Mundo
E
como eu palmilhasse vagamente
uma estrada de Minas, pedregosa,
e no fecho da tarde um sino rouco
uma estrada de Minas, pedregosa,
e no fecho da tarde um sino rouco
se
misturasse ao som de meus sapatos
que era pausado e seco; e aves pairassem
no céu de chumbo, e suas formas pretas
que era pausado e seco; e aves pairassem
no céu de chumbo, e suas formas pretas
lentamente
se fossem diluindo
na escuridão maior, vinda dos montes
e de meu próprio ser desenganado,
na escuridão maior, vinda dos montes
e de meu próprio ser desenganado,
a
máquina do mundo se entreabriu
para quem de a romper já se esquivava
e só de o ter pensado se carpia.
para quem de a romper já se esquivava
e só de o ter pensado se carpia.
Abriu-se
majestosa e circunspecta,
sem emitir um som que fosse impuro
nem um clarão maior que o tolerável
sem emitir um som que fosse impuro
nem um clarão maior que o tolerável
pelas
pupilas gastas na inspeção
contínua e dolorosa do deserto,
e pela mente exausta de mentar
contínua e dolorosa do deserto,
e pela mente exausta de mentar
toda
uma realidade que transcende
a própria imagem sua debuxada
no rosto do mistério, nos abismos.
a própria imagem sua debuxada
no rosto do mistério, nos abismos.
Abriu-se
em calma pura, e convidando
quantos sentidos e intuições restavam
a quem de os ter usado os já perdera
quantos sentidos e intuições restavam
a quem de os ter usado os já perdera
e
nem desejaria recobrá-los,
se em vão e para sempre repetimos
os mesmos sem roteiro tristes périplos,
se em vão e para sempre repetimos
os mesmos sem roteiro tristes périplos,
convidando-os
a todos, em coorte,
a se aplicarem sobre o pasto inédito
da natureza mítica das coisas,
a se aplicarem sobre o pasto inédito
da natureza mítica das coisas,
assim
me disse, embora voz alguma
ou sopro ou eco ou simples percussão
atestasse que alguém, sobre a montanha,
ou sopro ou eco ou simples percussão
atestasse que alguém, sobre a montanha,
a
outro alguém, noturno e miserável,
em colóquio se estava dirigindo:
"O que procuraste em ti ou fora de
em colóquio se estava dirigindo:
"O que procuraste em ti ou fora de
teu
ser restrito e nunca se mostrou,
mesmo afetando dar-se ou se rendendo,
e a cada instante mais se retraindo,
mesmo afetando dar-se ou se rendendo,
e a cada instante mais se retraindo,
olha,
repara, ausculta: essa riqueza
sobrante a toda pérola, essa ciência
sublime e formidável, mas hermética,
sobrante a toda pérola, essa ciência
sublime e formidável, mas hermética,
essa
total explicação da vida,
esse nexo primeiro e singular,
que nem concebes mais, pois tão esquivo
esse nexo primeiro e singular,
que nem concebes mais, pois tão esquivo
se
revelou ante a pesquisa ardente
em que te consumiste... vê, contempla,
abre teu peito para agasalhá-lo.”
em que te consumiste... vê, contempla,
abre teu peito para agasalhá-lo.”
[...]
na
íntegra em http://www.releituras.com/drummond_amaquina.asp
in
Claro Enigma / 1951
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